quarta-feira, 2 de abril de 2014

Cantinho do Poeta



Embora tenha acabado de receber uma nova participação para esta rubrica (será publicada na próxima semana) continuo a aguardar novos poetas que queiram usar este cantinho para divulgação dos seus poemas. Serão poucos, tímidos ou simplesmente não me lêem?

Este semana apeteceu-me deixar aqui um dos poemas mais conhecidos da língua portuguesa, de que gosto muito e que por variados motivos achei apropriado...



Pedra Filosofal

Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.

Eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho álacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
que fossa através de tudo
num perpétuo movimento.

Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é Cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,
Colombina e Arlequim,
passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.

Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida.
Que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.

António Gedeão, em Movimento Perpétuo de 1956


Sem comentários:

Enviar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

Recomendo

2666 - www.wook.pt

1Q84 - www.wook.pt

Wolf Hall - www.wook.pt

Na whislist


O Revisor - www.wook.pt

A Escriba - www.wook.pt